No século XVIII um filósofo chamado Jean-Jacques Rousseau acreditava na influência corruptora da sociedade humana. Ele defendia que nada era tão gentil e maravilhoso quanto um homem em seu estado bruto, pré-civilizado. Interessante que nessa mesma época, percebendo que lhe faltavam habilidades como pai, colocou seus cinco filhos num orfanato. Pois, a partir dessa crença de que as crianças são boas, imaculadas, deturpadas apenas pela sociedade e pela cultura, Rousseau passou a ter inúmeNasceu, então, a tese de o bom selvagem, que não passava de um ideal e não a realidade de carne e osso. A criança perfeita, o filho inocente, enganado habitam nossa imaginação permanentemente. É o Adão, antes da Queda, homem perfeito, sem pecado, caminhando com Deus no Jardim do Éden. Mas, os seres humanos são maus como também são bons e a escuridão que habita nossas almas atinge a todos. Em geral, as pessoas melhoram com a idade em vez de piorarem. O bullying, que se manifesta com intensidade terrível na escola, raramente se manifesta na sociedade adulta.
Além do mais, há exemplos dolorosos de que as maldades e horrores do comportamento humano não podem ser atribuídos tão ingenuamente à sociedade. Isto foi descoberto de forma dolorosa por Jane Goodall, a partir de 1974, uma estudiosa dos primatas. Infelizmente ela aprendeu que os amados chimpanzés que ela estudava estavam dispostos a matar uns aos outros. Em virtude do grande significado antropológico, ela manteve em segredo suas descobertas, temendo que seu contato com os animais houvesse produzido esse comportamento estranho. Mas, logo ficou evidente que o observado não era nada raro.
Falando de forma direta, os chimpanzés conduzem guerras intertribais de forma brutal. A despeito de um chimpanzé adulto ser pouco menor que uma pessoa, tem mais de duas vezes a força humana. Com horror, Goodall relatou a tendência que os chimpanzés têm de arrebentar cabos de aço e alavancas. Eles podem rasgar os outros em pedaços --- e fazem isso. Pequenas gangues de chimpanzés adolescentes, a maioria machos, perambulam pelas fronteiras de seu território. Se encontram chimpanzés forasteiros, mesmo já conhecidos e que se separam do grupo quando este ficou grande demais, os chimpanzés do local, se estiverem em maior número, atacam sem misericórdia os forasteiros. Ora, os chimpanzés não têm aquilo que chamamos de superego, e é prudente lembrar que a capacidade humana de autocontrole pode estar sendo superestimada. Os jornais diariamente mencionam e descrevem assassinatos brutais cometidos por motivos fúteis. Como disse um psicólogo, cada coisa que a gente vê, mesmo com apenas um olho aberto. Não é à toa que as pessoas querem permanecer cegas. Em nossa sociedade estão aparecendo, com mais constância do que supúnhamos, ataques de adolescentes às escolas que costumam frequentar, provocando mortes cruéis e ferindo brutalmente colegas e professores. O que passa intimamente no coração desses jovens assassinos?
Uma vez que crianças assim não são somente boas, não podem ser deixadas sozinhas, intocadas pela sociedade. Até mesmo os cães devem ser socializados se quiserem ser aceitos pela matilha --- e crianças são muito mais complexas do que cães. Isto quer dizer que há muito mais chances de que elas desandem de formas complexas se não forem educadas, treinadas. O processo de socialização previne muitos danos e fomenta muito do bem. As crianças deverão ser moldadas e informadas, ou não serão capazes de prosperar.
Crianças não sofrem só pelo abuso físico ou mental. Sofrem também pela desatenção. Elas sofrem quando os responsáveis por seus cuidados não as corrigem e as deixam sem direção. Não confundam crianças parecidas com "anjinhos" de olhos azuis, nem moleques irrequietos e bagunceiros com o caráter dessas crianças. Trazemos o germe do bem e do mau dentro do coração. Essa crença de o bom selvagem e de que pau que é torto já nasce torto é idealização, pura fantasia. A natureza e a sociedade punirão de forma draconiana quaisquer erros de comportamento infantil que permaneçam não corrigidos.